sexta-feira, outubro 31, 2008

Chuva

Cai cai
Gota a gota
A chuva
A terra saciando
No caminho resvalando.
Cai cai,
Gota a gota
Sua alma lavando
Cai cai
Gota a gota
Os olhos inundando
Memórias arrastando
Naquele esquecido pranto,
No perdido encanto.
Cai cai,
Gota a gota
A chuva
Cai cai cai,
A esperança secando
No grito amordaçado do engano.

Desacordo

Chegou trazendo o Sol no olhar,
No corpo aquele jeito doce de estar.
Partiu voltando a cabeça em gargalhada,
Deixando-o preso numa esperança desesperada.
Assim, em estudados passos, se cumpriu
Aquela morte anunciada,
Deixando gelo no seu coração em desvario.

Entardecer

Cai a tarde numa cama de nostalgia.
Aqui me sento vendo o lento pausar das folhas de Outono.
Aqui estou em pensamentos incompletos.
Em profundos silêncios que não grito.
Neste sossego que nenhuma pergunta perturbará jamais.

Penso o calor dos corpos em êxtase,
Gritos e gemidos mudos sem tempo nem espaço.
Naquela hora em que as bocas nas bocas se saciaram
Em que fiz de teu corpo minha rede,
E os teus cabelos foram o odor que me inebriou na paixão.
Ah momento sonhado em que em teu ventre sepultei meus beijos,
Em teu peito matei minha sede.
Naquele momento nunca existido em que
De ti em ti bebi a agua pura do teu gozo de mulher,
Tuas lágrimas de criança, em mim devolveram a semente em ti deixada.

Aqui me sento,
Nesta tarde,
Olhando o tempo que nunca chegou
Mas que desejei com o mesma
Paixão terna e louca que em sonhos me entreguei.

Estória breve

Era uma vez, duas, três, sei lá
Aquela figura de vento ondulante.
Olhava as cousas com a proximidade da distância
Com a coragem que só o medo empresta.
Era uma vez, ou mais, talvez
Aquela figura de seda despida,
E orvalho na pele.
Tinha o perfume de giestas e torgas nas manhãs de inverno
Em que andam faunos pelos bosques.
Por vezes vinha-lhe a fragrância do fim de tarde
Ao redor do fogo de lenha crepitante.
A figura, umas vez criança outras tantas mulher sedenta,
Caminhava ao longo da estrada como se os pés pedissem desculpa ao caminho.
O olhar distantemente presente, perdidamente encontrado no percorrido percurso

quarta-feira, outubro 29, 2008

(Des)Norte

Percorro calado as ruas frias da pequena cidade a norte.
Silencio bebido em cada passo no granito da calçada. Tudo aqui é calma entrecortada pelo passar dum carro, o ladrar longínquo de um cão, pelos gritos do meu pensamento em busca a liberdade.
Gosto deste cheiro que inunda o ar de Outono. Cheiro a lenha e da humidade quente que me transporta a mil recordações de tempos antigos quando, de mãos entrelaçadas, percorria estes mesmos silêncios. Com olhos cheios de esperanças que o tempo afastou.
Gosto destas ruas de falsa dureza. Aqui o cinzento mistura-se com o alvo das paredes e os campos nunca deixam de ser verdes. Aqui a mente ganha asas e pairo sobre os meus próprios abismos. Aqui lembro os momentos em que na vida fui feliz, reflectido no olhar de alguém. Nesta paz enfrento as minhas próprias guerras.
Percorro até ao cansaço a o granito da cidade pequena a norte.
Lembro os campos que a abraçam e o mar que a banha e ouço-lhe os murmúrios como se meus próprios gritos se tratasse. Os gritos que algumas vezes lhes depositei e que agora me devolvem como uma maldição esperada.
Aqui bebi o vento e alcancei a alma e me perdi, aqui comecei e me terminei, aqui me entreguei para tornar a partir. Aqui, neste vento que me acompanha, está a génese de que sou feito e que tantas vezes desejei partilhar.
Percorro calado as ruas frias…
O filme dos dias inundam-me a memoria e toldam-me os olhos em interrogações que lanço no espaço e que me impedem de ver.
Percorro calado, lentamente as ruas frias, procurando em vão as mãos que, outrora, na tarde dos tempos, se abrigaram nas minhas.

quinta-feira, outubro 23, 2008

Encantado

Me encanta tu sonrisa, tus ojos que hablan de cosas que no se vean,
De las distantes montañas y de campos desconocidos
Y flores y el olor de la lluvia en la tierra.
Si, me encanta tu sonrisa
Y también tu silencio en que hablas callada de las cascaradas de tu Ribeira.
Si, perdóname se me encantas
Mas la verdad será siempre un cutillo en mi boca,
Pronta a cortar tu hielo!

quinta-feira, outubro 16, 2008

Descrença

Gostava de acreditar no amor!
Aquele amor que nos persegue e nos arrebata em cada suspiro.
Aquele amor feito certeza e duvida e desvario.
Aquele amor que nos enche, aquele ciúme que nos resgata.
Queria acreditar no amor feito pessoa.
Aquela hora que parece nunca mais chegar!
Ah! queria sentir o desejo na chamada
O misterio num olhar desvendado.
A carícia do orvalho da manhã quando dois corpos se fundem.
Sentir que naquele momento somos um, num simples gesto, feito beijo.
Percorrer aquele corpo como quem parte em busca do continente perdido.
Perdendo-me e encontrando-me no oasis daquele ventre,
Nas colinas daqueles seios onde em fonte me sacio.
Perdido sim nos lençóis, no chão, entre despojos do dia.
Queria acreditar naquela voz que não me chama,
Que não me deseja mais que um animal da beira do caminho.
(e eu que á beira do caminho estou)
Queria acreditar que o amor é possível
Na cumplicidade do beijo,
Nas palavras proferidas em silencio quando as mãos se unem.
Queria beber daquela pele, suor e êxtase em silêncios gerados
Mas o amor fugiu de onde nunca esteve.
Enganou-me com o canto de sereia, que não escutei.
E hoje aqui me quedo somente com esta descrença em que creio!

domingo, outubro 12, 2008

Fuga

Foges com os olhos de mel.
Foges com esses lábios de maresia
Foges com a seda na pele,
Foges com o receio do teu dia.
Fico com na esperança de um beijo,
Ardendo no fogo do desejo,
Permaneço, ouço e vejo
No silencio do teu corpo
Onde, em querer, adormeço e acordo!

Gosto...

Gosto de ti!
Devia calar?
Amordaçar?
Não gritar?
Ignorar?
Mas, se gosto de gostar...
E mesmo sem a força do teu olhar,
Irei sempre recordar: Que gosto de ti

terça-feira, outubro 07, 2008

Declaração

Estou farto de falsidade!
Cansei-me dos falsos moralismos, dos beatos de sacristia que tanto rezam mas que tão pouco cumprem a humildade.
Estou farto dos que se diziam amigos e que, nas primeiras vagas, decidiram abandonar o navio e criticar quem ficou para, bem ou mal tentar conduzir a nau a porto seguro. A todos eles o meu obrigado por terem passado pela minha existência. Convosco aprendi o quão volátil é a pequenez humana que prefere estar nos bons momentos a ajudar a superar os maus.
Aproxima-se tempo e mudança. Novos desafios, novas tormentas e calmarias e sei que não posso contar convosco. Isso é, para mim já em si uma vitória. Menos lastro a pesar-me a carga, mais espaço para aqueles que realmente são de todas as horas.
Estou farto de imposta solidão!
Sei que tenho em mim a capacidade de amar alguém porque me amo a mim próprio. Nu e imperfeito mas humano, ser humano sendo-o. Sei que mereço o afecto alheio e que ele vai aparecer, quando menos esperar ao virar da esquina da vida! Voltar a sentir o calor de um beijo e a cumplicidade de uma conversa partilhada. Sei que vou ter a surpresa do telefone tocar, de sentir que alguém vai querer saber de mim.
Novo tempo, novas esperanças
A quem estiver a meu lado agradeço desde já a honra que me dão, aos outros, a lição por terem partido! Não nos merecemos!

domingo, outubro 05, 2008

Pedido á beira dum caminho

Deixa que me perca em teus olhos.
Não peço muito, somente aquele olhar antes de adormeceres
Ou o primeiro quando despertares, pouco importa.
Deixa, por favor,
Que na noite fria me abrigue na seda quente da tua pele,
Envolcro suave da tua alma,
Para em ti derramar meu sangue fervilhante de desejo.
Vá lá não me negues aquele beijo furtivo que nossos labios pediram.
Deixa vá,
Que a vida é breve e longo o desejo desses teus braços de cedro.
Deixa que me perca nesses teus cabelos de terra pintados
Que deles lhes beba o cheiro doce dos campos humidos.
Deixa que em ti me perca para logo me encontrar,
do recanto do teu olhar.
Entende, quero poder tocar-te a alma.
Quero saber que me chamas
Que, com minhas letras escreves também teu destino.